Pagando Pela Governança Global: A Futura Instituição de um Imposto Mundial

Autor: Carl Teichrib
Forcing Change, Edição 8, Volume 1.

Outra mão está tentando aliviar sua carteira. Se conseguir, ela tirará recursos dos "cidadãos mundiais" e os transferirá diretamente para a "comunidade internacional". Não, isto não é uma piada. As propostas de uma tributação global já estão sobre a mesa há algum tempo. Além disso, com cada nova proposta apresentada, um novo passo é dado para fazer avançar uma ideia que é de muito interesse para a Organização das Nações Unidas.
Atualmente, a ONU é financiada principalmente pelas contribuições de seus países-membro, o que muitos veem como uma restrição ao crescimento dessa organização internacional. De modo a se libertar dessa restrição monetária, imposta pelos países soberanos, muitos acreditam que uma fonte alternativa de receita seja necessária. Esperando ver uma forma de tributação global ser instituída, políticos do Canadá, Bélgica, França, Inglaterra, Brasil, Uruguai, Estados Unidos e outros países [1] estão trabalhando em esquemas supranacionais de tributação desde que o Canadá inseriu o conceito em seu Código Tributário em 1999.

Entretanto, a busca de financiamento apropriado para as Nações Unidas é muito anterior a isto. Ao discursar em 1963 para a Associação dos Graduados da Universidade de Harvard, U Thant, o então secretário-geral da ONU, descreveu como uma futura "força policial mundial" da ONU somente poderia se tornar realidade quando as dificuldades econômicas da organização fossem superadas. [2]. Similarmente, Richard Falk, um dos advogados mais influentes em Direito Internacional reconheceu a importância de financiamento independente, em sua série de quatro grandes volumes intitulada The Strategy of World Order, publicada em 1966 pelo Fundo de Direito Internacional. Falk observou:

"Se concebermos a vida em um sistema internacional drasticamente alterado, com uma Força Policial da ONU e uma Secretaria de Desenvolvimento Mundial tendo um orçamento de 50 bilhões de dólares por ano, então a necessidade de possuir fontes garantidas de receita é realmente significativa." [3].

Hoje, os objetivos econômicos das Nações Unidas ultrapassam grandemente a marca dos 50 bilhões de dólares por ano.

Contabilidade Criativa

Procurando formas de alcançar a independência financeira para a ONU, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas examinou inúmeras ideias nos anos 1990s, incluindo a criação de uma loteria internacional, [4] um programa de cartão de crédito [5] e a imposição de "multas" para as violações da Lei Internacional. [6]. Uma proposta singular que está circulando dentro da comunidade internacional é a de uma Agência de Seguros Para Serviços de Segurança da ONU. Este plano, se implementado, permitirá que países pequenos e que não têm forças militares significativas paguem prêmios de seguro para as Nações Unidas. Em troca, a ONU garantirá a segurança da nação segurada mobilizando unidades militares contra qualquer outra nação que ameaçá-la. [7]. Com esta sugestão, a ONU é capacitada de duas formas diferentes que elevam o organismo internacional muito além de sua estatura atual.
Geração de receita para o organismo internacional.

A ONU recebe sua própria força militar internacional para lidar com potenciais infrações de segurança. Contribuições e taxas de uso foram sugeridos como opções viáveis de financiamento. Em Our Global Neighborhood (Nossa Vizinhança Global), o relatório da Comissão Sobre Governança Global, patrocinado pela ONU, diversas opções de contribuições são mencionadas:
Um adicional sobre as passagens aéreas, incluindo uma cobrança extra para os voos internacionais.
Cobrança sobre o transporte marítimo de cargas pelo uso das águas internacionais.
Adicionais sobre a pesca nos oceanos (fora das regiões costeiras)
Taxas de uso para as atividades na Antártida.
Cobrança pelo posicionamento de satélites geoestacionários. [8].

Mas, de todas as várias propostas, os esquemas de tributação mundial receberam maior atenção. Para este fim, a Comissão Sobre Governança Global sugeriu diversos modelos tributários, incluindo um "imposto sobre o carbono" baseado nas emissões de carbono, e um imposto cobrado sobre as empresas multinacionais. [9]. Embora a Comissão tenha reconhecido que os tributos nunca sejam politicamente bem-aceitos no melhor dos tempos, ela reconheceu um plano particular sobre todos os outros: um esquema agora aceito oficialmente, pelo menos em princípio, pelo principal parceiro comercial dos EUA.


O Canadá Adota a Taxa Tobin

Em 1978, o economista norte-americano James Tobin publicou suas ideias sobre reforma monetária global no The Eastern Economic Journal. Seu conceito, agora conhecido como "taxa Tobin", propunha uma cobrança universalmente aceita sobre as transações cambiais.

Considerando-se os trilhões de dólares negociados a cada ano (estima-se que sejam 1,2 trilhão por dia [10]), o potencial para a geração de fundos é imenso. Além disso, de forma a vender a ideia para os governos nacionais, o conceito está sendo divulgado como um modo de cortar as asas dos operadores "indisciplinados" que atuam no mercado de câmbio. [11]. Na verdade, a taxa Tobin tem sido tão bem recebida em certos círculos de definição de políticas, que em 1999 o governo canadense endossou oficialmente o plano, dando-lhe legitimidade jurídica.

Em 28 de outubro de 1998, Lorne Nystrom, um membro do parlamento canadense, apresentou a taxa Tobin na Casa dos Comuns. Descrevendo o tributo como uma "parte viável de uma nova ordem mundial e de uma nova visão do mundo" [12], Nystrom descreveu como os cofres poderiam estar cheios se o tributo tivesse sido implementado com base nas transações cambiais realizadas em 1995. Em seu discurso na Câmara dos Comuns, o objetivo do tributo que ele desejava ver instituído foi delineado em uma linguagem bem clara:

"Se houvesse uma taxa Tobin de 0,1% sobre as transações em moeda estrangeira, isto geraria, 176 bilhões de dólares americanos. É muito dinheiro. Uma taxa Tobin de 0,003% geraria receita suficiente para financiar as tropas de paz da ONU em todo o mundo... Uma das consequências seria o estabelecimento de uma aldeia global que teria um bem comum entre todos os países do mundo. Haveria o fortalecimento das organizações internacionais. A ONU se tornaria um governo mundial significativo e compartilharia as coisas com os governos nacionais em todo o mundo. Poderiam existir forças de paz internacionais permanentes. Muitas coisas poderiam ser feitas." [13].

Nystrom também disse que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial poderiam ser reformados para implementar esse plano, embora ele preferisse que "uma nova agência financeira internacional administrasse a taxa Tobin" [14]. De acordo com o parlamentar canadense, o mundo seria um lugar melhor para vivermos se houvesse uma Secretaria da Receita Mundial.

Embora alguns membros do Parlamento tenham expressado oposição à proposta de instituição do novo tributo, ela recebeu amplo suporte dos vários partidos. Em 23 de março de 1999, o Parlamento canadense aprovou a taxa Tobin por 164 a 83. No tempo presente, a taxa está simplesmente inserida no Código Tributário, com a compreensão de que quando a comunidade internacional a aceitar plenamente, o Canadá já estará preparado para ela.

Considerando-se que o Canadá é o maior parceiro comercial dos EUA e que o comércio bilateral entre as duas nações ultrapassou 500 bilhões de dólares no ano de 2005, a decisão pela taxa Tobin tem mais consequências potenciais do que apenas encher os bolsos da ONU. Se e quando o tributo começar a ser cobrado, seja daqui a um ano, ou daqui a dez anos, o esquema terá um impacto no preço dos bens e serviços que cruzam a fronteira. Além disso, a carteira dos cidadãos contribuintes estará um pouco mais leve.

Pressão Para Aceitação Por Parte dos EUA

Dentro dos EUA, a adesão à ideia da taxa Tobin está sendo lenta, mas fez uma pequena introdução no sistema político federal. No ano de 2000, o congressista Peter DeFazio (D-OR) e o senador Paul Wellstone (D-MN) exortaram o governo a instituir o tributo global. Certos grupos de interesses especiais também se uniram à ideia. O Centro para o Desenvolvimento Econômico Ambiental, baseado na Califórnia, estabeleceu a "Iniciativa da Taxa Tobin" [15]. Além disso, a Associação Federalista Mundial (agora conhecida como Soluções Globais), o maior grupo de lóbi do governo mundial dentro dos EUA, está ajudando a aumentar a pressão para a aceitação.

Organizações não-governamentais (ONGs) internacionais, grupos especiais de interesses com influência no mundo inteiro, também oferecem suporte. O Movimento Federalista Mundial (WFM) que é uma organização guarda-chuva sob a qual a Associação Federalista Mundial opera, tem feito grandes esforços para levar adiante os princípios da taxa Tobin. Seu presidente-executivo, Bill Pace, exerceu um papel crítico durante o Fórum do Milênio da ONU (de 22-26 de maio de 2000), em que mais de mil ONGs de todo o mundo participaram dos processos de reforma da ONU. [16].

Durante uma das sessões do Fórum, os delegados debateram as ideias para o financiamento alternativo da ONU. Novamente, a taxa Tobin recebeu uma alta prioridade. Durante o dia final do Fórum, o advogado especializado em Direito Internacional Richard Falk — por convite de Bill Pace — teve um encontro especial com os federalistas mundiais e outros líderes-chave a respeito das propostas específicas de governança global. Sem qualquer surpresa, muitos dos participantes no encontro tinham dado suporte verbal à taxa Tobin anteriormente durante aquela semana. Tendo participado daquele Fórum, tornou-se claro para mim que a tributação internacional é vista como um marco estratégico na criação de um governo mundial. Entretanto, existem problemas.


Problemas com a Tributação

Embora grandes progressos tenham sido feitos para avançar a ideia de um tributo mundial, existem sérios problemas com a implementação. O tributo teria de ser aceito universalmente; caso contrário, os países não-participantes rapidamente se tornariam paraísos fiscais. Com isto em mente, que opções para a imposição seriam usadas para os países que não aderirem? Quem fará a coleta do tributo e supervisionará seu uso? Como um tributo global afetaria as economias regionais e nacionais? Quais salvaguardas seriam empregadas para impedir a corrupção ou para evitar que a alíquota cresça continuamente?

A princípio, os problemas em torno da criação e administração do tributo podem parecer insolúveis. Entretanto, o fato permanece que agora existe um esquema de tarifas globais harmonizado, o que antes era considerado tão utópico quanto o tributo internacional que está sendo discutido atualmente. Grandes organizações e indivíduos influentes dentro da comunidade internacional não estão perguntando "se" ou "quando", mas, em vez disso, "o que é necessário?".

Além das complicações previsíveis associadas com a implementação de um tributo mundial para dar maior força à ONU, um grande perigo existe naquilo que esse tributo representa. No terceiro volume de Strategy of World Order, de Richard Falk, Norman J. Padelford, um dos primeiros defensores da reforma monetária da ONU, faz uma advertência sobre o financiamento independente:

"O poder de uma bolsa independente poderia se tornar o prelúdio para a tomada e exercício de poder independente. Isto poderia ser prejudicial para a independência nacional e, posteriormente, até para as liberdades individuais." [17].

Vi esse perigo quando participei de uma conferência sobre o governo mundial voltada para os jovens, em Washington, durante a primavera de 1999. [18]. Em um dos painéis, uma das ocupantes da mesa, uma jovem mulher americana, enfatizou rigorosamente a necessidade de um sistema de gestão mundial equipado com o poder de tributar:

"No nível internacional, o imposto progressivo precisa ser implementado... Atualmente, aceitamos aqui neste país tributos no nível estadual e nacional. Um governo mundial bem-sucedido depende da aplicação desse sistema em escala internacional. Além dos sacrifícios econômicos, o governo mundial eficaz envolve o sacrifício de certas liberdades. Ao cultivar a segurança por meio de um sistema respeitado de imposição da lei, todas as nações e, portanto, todas as pessoas, precisarão cooperar e fazer alguns sacrifícios... O governo mundial precisa estabelecer um equilíbrio onde certas liberdades são restringidas para o bem maior da humanidade... as leis globais transcendem a lei nacional e a unidade tem maior peso que a diversidade. Isto requer que cada Estado nacional ceda certos direitos para o governo mundial, comprometendo-se a obedecer as decisões internacionais. [19].


Financiando a Governança Global

Frequentemente se diz que os dividendos derivados dos programas alternativos de financiamento das Nações Unidas, como a taxa Tobin, serão usados para tornar o mundo um lugar mais seguro. O secretário-geral U Thant inferiu isto em seu discurso na Universidade de Harvard, em 1963, e a ação legislativa canadense de 1999 também demonstrou esse elo entre a tributação e a polícia e a segurança mundiais.

O fato de existirem diversos planos para criar uma força policial e militar internacional, seja sob o guarda-chuva direto da ONU, ou de alguma outra forma conectada ao processo de tomada de decisão da ONU (isto será analisado em um artigo futuro), nos dá uma janela para a importância do financiamento alternativo. Da forma atual, a ONU não tem os meios econômicos para colocar em campo um grupo de batalha plenamente funcional. Portanto, para os sonhos de segurança global sob os auspícios da ONU serem realizados, a questão do financiamento terá de ser tratada e implementada.

O Canadá já se adiantou e agora aguarda que o mundo adote a ideia para que o tributo internacional possa ser cobrado de forma juridicamente legal. Na verdade, no ano seguinte após o Canadá ter adotado a iniciativa do tributo internacional, o Parlamento Europeu começou a se interessar seriamente pelo plano. Em 2003, a Bélgica colocou sobre a mesa de discussões uma plataforma de tributação global similar. Outros países estão contemplando passos similares.

Se um tributo internacional se tornar uma realidade, para permitir a segurança global, ou por qualquer outra razão, ele elevará as Nações Unidas ao nível de um regime soberano. Como A. W. Clausen, ex-presidente do BankAmerica Corp. e do Banco Mundial declarou em 1979: "Os controles do dinheiro e do crédito tocam no coração da soberania nacional." [20].

Com toda a certeza tocam. Os controles do dinheiro e do crédito, dois aspectos que se encaixam com um esquema tributário, dão poder ao usuário final com alavancagem econômica soberana. Portanto, se a ONU obtiver autoridade para tributar, seja por meio dos países-membro participantes ou via outro circuito, o organismo internacional poderá ser ampliado para se tornar uma entidade governante semiautônoma. Afinal, a capacidade de criar riqueza a partir da tributação é poder e prerrogativa de um governo, e é nisto essencialmente que a ONU se transformará.

Notas:

1. Para mais informações sobre quais países e políticos estão trabalhando nesta ideia, veja o link indicado a seguir: http://tobintaxcall.free.fr/list.htm. Veja também a Carta Aberta intitulada "The Tobin Tax at the ECOFIN".

2. U Thant, "Força de Paz das Nações Unidas", um discurso diante da Associação dos Graduados de Harvard, Cambridge, Massachusetts, 13 de junho de 1963. Conforme reimpresso emThe Strategy of World Order, Volume III: The United Nations (World Law Fund, 1966), págs. 526-534.

3. Richard Falk and Saul H. Mendlovitz, The Strategy of World Order, Volume III: The United Nations (World Law Fund, 1966), pág. 731.

4. Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, Debate Sobre Ideias Novas e Inovadoras Para Financiamento, 23-24 de julho de 1997. Boletins para a imprensa da ONU.5. Ibidem.

5. Ibidem.

6. James A. Paul, Declaração Sobre Financiamento Inovador ao Conselho Econômico e Social da ONU, 11 de julho de 1996.

7. James A. Paul, Financiamento Alternativo para a Paz Global e o Desenvolvimento (Fórum de Políticas Globais, setembro de 1997).

8. Comissão Sobre Governança Global, Our Global Neighborhood (Oxford University Press, 1995), págs. 220-221.9. Ibidem, págs. 218-221.

9. Ibidem, págs. 218-221.

10. Veja "Currency Transaction Tax – Question and Answers", http://www.currencytax.org/questions_and_answers.php.

11. Veja o livro de Paul Hellyer Stop: Think (Chimo Media, 1999), pág. 176.

12. Lorne Nystrom, "Tax on Financial Transactions", Private Members Business, Edited Hansard – Number 144, 28/10/1998, Casa dos Comuns, Governo Federal Canadense, pág. 1735.13. Ibidem, pág. 1745.

13. Ibidem, pág. 1745.

14. Ibidem.

15. O sítio na Internet para a Taxa Tobin para o Centro de Desenvolvimento Econômico Ambiental é http://ceedweb.org/iirp.

16. O autor deste artigo foi um delegado no Fórum do Milênio da ONU. Qualquer referência às atividades do Fórum deriva de suas experiências e dos documentos internos distribuídos aos participantes.

17. Norman J. Padelford, "Financial Crisis and the Future of the United Nations", The Strategy of World Order, pág. 768.

18. Esta conferência, patrocinada pela Associação Federalista Mundial e pelo Centro Pela Paz Global, foi chamada de "Conferência Nacional da Juventude Sobre o Apelo de Haia Pela Paz". As datas foram de 9-11 de abril de 1999 e ocorreram no Edifício Ward, da Universidade Americana.

19. Não vou publicar o nome desta jovem participante por causa de sua idade no tempo do encontro.

20. A partir de uma entrevista entre Michael Loyd Chadwick e A. W. Clausen, conforme publicada na edição de 1981 do Freemen Digest on International Banking, pág. 21.

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